domingo, outubro 30, 2005

Sexo-Expresso (XXVIII) ou O Sexo na música


(Otto Dix, pintor alemão de 1891-1969)
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O erotismo no Fado não é de hoje, sempre lá esteve. Brejeiro, mas sempre lá esteve...
«Ao fado canta-se a vida.
Ao fado canta-se a morte.
O fado canta a partida, a despedida, a nossa sorte
»
Em 1985, o lisboeta António Coelho compunha este soneto a que recorro hoje - 20 anos depois - para cruzar as fontes de inspiração socioculturais do fado do séc. XXI e o erotismo na "escala fadista".
A condição humilde que caracterizou Severa no séc. XIX (das primeiras fadistas de Lisboa conhecida por "chorar" uma ligação amorosa e tumultuada com o Conde de Vimioso) e lhe imprimiu características de interpretação registadas na história da música portuguesa, continuará presente nas linhas temáticas do fado de hoje?
Que enredos sofridos ou revoltas silenciosas recheiam o imaginário cantado dos intérpretes actuais?
As actuais democracias e o seu presente não menos perturbado (um denominador comum desta expressão artística) já não se evidenciam úteis nos conteúdos modernos como antigamente? Por exemplo, antes lamentavam-se as histórias dos filhos destinados à morte durante os difíceis anos de conflito armado nos territórios ultramarinos do regime de Salazar.
Sabemos que Portugal está em crise de valores há algum tempo e que a era da globalização consegue fazer de qualquer ouvido sensível um órgão tísico aos valores centrados no Homem como potencial realizador e o contista por excelência da história humana.
O fado, outrora ladainha de esperança perante a cruel desorganização do tempo social (popular) e um carpir consolador para os cantores amadores e os ouvintes dos bairros humildes, só preserva hoje das suas origens a espinha formal.
A única semelhança entre o "fado moderno" e o "fado antigo" é a cantiga em estrofes e acompanhada por dois instrumentos dedilhados, normalmente a guitarra e a viola.

«O fado é terno, é amigo dedicado.
Quer antigo, quer moderno,
nosso fado é sempre fado
»

Cantava o fadista António Coelho. Mas, no púlpito impresso de Eduardo Prado Coelho no "Público" (Junho de 2005) reclamam-se serem estes outros tempos. Os do «fado maior. Do pós-fado ou do transfado».
O crítico sugere que a sua expressão estética e temática comuns estão longe do simples entendimento da letra ou da palavra contada (a narração directa de vivências pessoais ou relato de uma circunstância qualquer vivida) como era usual e individualizado pelos cantores(as) e diz ainda que «a perspectiva demasiado cerebral e fria, o snobismo intelectual, a excentricidade premeditada e a falta de calor humano» concentram uma extrema erudição «que em Portugal encontra reservas».
Palavras elegantes, mas insensato e irrealista considerar que há para os fadistas modernos "assuntos mais altos" do que havia para os antigos.
Hoje o fado encontra os mesmos imperativos - embora noutros moldes - e a mesma agitação social que o suscite a personalizar uma certa anarquia e ter as consequentes reacções na esfera pública e com a visibilidade que pretende.
Já não há a prepotência de Oliveira Salazar que proibia a sua comunicação aos pobres das cidades (justificando-o por não corresponder ao ideal do Trabalho, Família e Pátria) mas há muitos mais "bloqueios comunicativos" a que infelizmente temos que fazer a continência.
O fado é e sempre será um produto de gozo popular genuíno (apesar das suas divas) e o que fez dele um emblema nacional mundialmente conhecido foi a ingenuidade tecnológica de mulheres como Amália Rodrigues - o genuíno produto turístico - e não a sofisticação visual de Mísia («o lançamento foi no mítico Maxime. Candelabros, espelhos, cortinados. Todo um ambiente de decadência faustosa, extremamente envolvente e fascinante») ou os ângulos cénicos de Aldina Duarte («um cenário lindíssimo, de uma parede grenat, com uma porta no meio e projecção de nuvens, que, como o fumo das palavras e dos sonhos, transformava a imagem do céu obscurecido, uma inteligente e comovedora encenação de Jorge Silva Melo») como aspira Prado Coelho.
Numa leitura vertical parece-me haver um certo endeusamento da protagonista em cena (reparem que este tipo de descrição não se encontra para os homens fadistas) e em formatos pictóricos que sugerem uma nova linha temática e de projecção para este tipo de "cantar": «Desde os tempos do Frágil que Anamar é para mim um nome mítico. Alguns serão sobretudo sensíveis á sua presença vulcânica sobre um palco e aos aspectos de romantismo e sensualidade».
Ora, esta unidade de estilo sempre lá esteve, só que antes figurava-se num xaile bem vistoso, bijuteria brilhante e tudo sobreposto numa figura feminina negra e cuja proposta física se propunha ao nível do rosto e tronco para alcançar teatralidades emotivas de grande intensidade para quem a ouvia na penumbra de um ambiente nostálgico e melancólico.
Tudo boa música e bom "teatro", também. Mas um espectáculo cujo mérito reunia essencialmente os aspectos caracterizadores dos temas e a ambivalência pessoal e vivificada do intérprete naquele preciso momento.
Ontem e hoje, no fado canta-se muito do que na vida escapa ao domínio humano, incluindo a morte, por exemplo.
Para invocar variantes sofisticadas deste tipo de canção e sugerir um efeito artístico quase telúrico e próprio das estéticas modernas, outros como Prado Coelho sugerem um fado evoluído que já não é fado («é o modo como se veste, os sapatos e o chapéu. É o modo como, de costas, em dada altura se despe e fica apenas com um sugestivo vestido negro.... Anamar é uma personalidade sedutora, embora o que a distingue quase nos assuste: um vento de loucura que avança pela noite de Lisboa»).
Quando ouço "Um Homem na Cidade" de Carlos do Carmo, fecho os olhos e quase me babo com o imaginário urbano de Lisboa que os sonetos me sugerem. Deliciam-me os actores dessa "fotografia" rápida pela objectividade do sentimento idealizado e tão bem expresso na letra e a voz harmoniosa. O que predomina é a ideia, o conceito, e não um horizonte vago e essencialmente ocupado PELA figura (neste caso, de presença naturalmente charmosa e cantar sugestivo).
Para outros géneros musicais o mesmo já não acontece? Em outras músicas e outros músicos trata-se evidentemente de show business.
Não, não me parece ser o que chamam de «transfado» um complexo fenómeno onde se adivinha uma simbiose e compreensão profunda de outras áreas da cultura em geral.
A "palavra" da canção neste género musical - que anteriormente exerceu magia pela associação de contextos e sensibilidades sofredoras e de destino fatídico - não penso apresentar-se hoje com uma inovadora variante, assim tão fértil e quase alucinatória de conceito e estética.
Se calhar o fado, como outras expressões artísticas, goza de novos e potenciais elementos acessórios que o "iluminam" em inimagináveis ângulos de performance...
Se calhar as fadistas estão mais bonitas hoje, ou direi deliciosamente eróticas?
As fadistas sempre "encheram" bem o peito e rasgaram as goelas para que as notas lhes saíssem bem do fundo do âmago - o mesmo que pare os filhos...
Bem... talvez nunca tenha sido de «quase nos assustar», como «um vento de loucura que avança pelo» nocturno erótico da cidade, parafraseando Prado Coelho.

sábado, outubro 29, 2005

O DNA n.465


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Para mim, que sou um bicho do papel, desconfio que amanhã os jornais não se vão parecer com JORNAIS... Mas newsletters sofisticadas de grande formato e ao serviço dos domínios que as custearem.
As revistas não se vão parecer com REVISTAS... Mas encartes vaidosos e de fino acabamento onde as notoriedades desfilarão a colecção Vista Alegre da tetra-tetra-tetara-terera......tera-Avó que a Sotherbys já avaliou, mas que não interessa a nós quanto.
Nesta altura, suplementos como o DNA deixam de fazer qualquer sentido. Antes saíam caros mas a imprensa (empresarial) oferecia-lhes a sobrevivência e o estatuto de coqueluche em troca de discretos favores de corte - como misturarem dos seus por entre o jornalismo de referência e mui raras vezes intocável.
Num futuro próximo, quando só o que tiver fama forem mascotes jocosas da Comunicação (porque a obscenidade mental ainda é indecorosa!), embrulhos de imitações rascas do humor ilustrado de Bordalo Pinheiro ou das ficções de jornalistas convertidos em pseudónimos de escritores... nessa altura, os suplementos como o DNA não se vão parecer com SUPLEMENTOS...
Após ter sido anunciado o futuro encerramento deste pequeno jornal, da Grande Reportagem e do JN (sem confirmação e ainda em estudo), chegou às bancas o nº 465 de Pedro Rolo Duarte em exploração do Terramoto de 1755 em Lisboa.
O cruzamento do jornalismo de investigação, científico, bibliográfico, fotográfico e de ilustração, oferece aos curiosos da vida e afectivos desta cidade uma edição "sísmica" em 61 páginas.
Mesmo com a inevitável sintetização e sacrifício informativo do tema, é como PRD canonizou há muito nos seus editoriais: «Este é mais um DNA para ler e guardar...»
No seu editorial para Lisboa e seus habitantes, Pedro Rolo Duarte permitiu-se à intimidade de sugerir-nos «Ir ao passado buscar sinais que servem o presente. Olhar a História como algo que transforma, muda e não adormece nos arquivos e na memória».
Logo saberemos se PRD fazia contas á vida e se despedia de todos nós, os leitores, ou se fazia contas aos 250 dias do Terramoto de 1755, em Lisboa.
Logo saberemos...

sexta-feira, outubro 28, 2005

Os dramas do crescimento

Cada vez mais me convenço que aquela história de nos "sedimentarmos como indivíduos só até aos 25/28 anos" é um grande equívoco e, porque estamos sempre a aprender, diz a lógica que cresçamos até morrer.
Mas crescer não é o mesmo que aprender, embora para crescermos seja preciso aprender algumas coisas - sobretudo coisas sobre nós com os outros nesta salganhada civilizacional.
Ou seja, não confundamos processos de cognição com processos de maturação individual e social do indivíduo na globalidade. Porque a ser assim o mundo tinha-se ficado pela I Guerra Mundial e João Paulo II não tinha preciso nascer depois de duzentos e tal papas para prestar os devidos reparos e homenagens às vítimas da Inquisição católica ou aos judeus exterminados com o conhecimento da mesma instituição.

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Hoje parece-me que quando era adolescente foi bem mais fácil encenar os dramas do meu crescimento. Os reais e por isso naturalmente pudicos à exposição dos progenitores e outros, e os irreais e próprios do idealismo naïf de quem já desconfia que o mundo à sua volta não vem a quem por direito natural, mas responde ora justa, ora injustamente às investidas e provocações legítimas de cada um.
Por exemplo, a sexualidade avançada foi um drama verdadeiramente sério, inclusive para meus pais impotentes perante a comunidade deserotizada que não sabia sequer que existia o Planeamento Familiar e Sexual para Jovens, quanto mais ouvido falar do precioso Relatório Right que li viciosamente até ao seu último orgasmo tipográfico.
Uma chatice!
Ser obrigada a desenvolver um eros profícuo entre filhos taurinos da terra e filhos de falhados das ex-colónias e de líbido ainda mais pueril que a minha adolescente!
O resultado - e isto é cá comigo - considero-o desastroso e injusto. Afinal, fiquei em banho-maria até aos 18 anos suburbanos e só arranjei amantes porquando me inscreveram numa escola de Lisboa e passei a sair de casa e a fazer amizades.
18 Anos, uffff!!!!!!!
Desastroso porque me vi obrigada a transgredir os canônes da lascívia quando a sociedade já não mo tolerava por ser adulta e injusto por verificar uma grande dose de intolerância e subdesenvolvimento sexual na classe masculina (acabadinhos de chocar ou com idade para serem meus pais) perante o meu sentido estético da coisa carnal e louca.
Correndo o risco de parecer convencida deixem-me, pelo menos, apelar pelo lado comum e prático e que é o que eu não fiz(!!!!) quando miúda e que nos 17 anos a seguir obrigou-me a verdadeiros alpinismos.
Vendo bem... talvez tenha sido dos males o menor, porque o pior veio a seguir.
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Quem teve a triste ideia de sugerir à juventude a ingenuidade de que o "mundo gira e abraça-nos" bem podia ficar caladinho no seu canto.
Doía-nos menos! O mundo não gira e muito menos nos acolhe num regaço generoso.
Pondo de parte as considerações astronómicas que não são para aqui chamadas, o mundo social é essencialmente estático e somente cabem aos desejos de cada um de nós criar-se a ilusão de que o exterior se transmuta e se faz à nossa medida (embore avance ciclicamente de século a século, cada um tem mais anos do que o nosso período por cá).
Afinal, o que são os dramas do crescimento? São as aparentes distorções entre o que julgamos ser e o que verificamos não encaixar com os outros (uma matriz global que é suposto também ter coisas de nós).
Quando os dramas de crescimento são de ordem ideológica e já marinamos na idade adulta, é bem mais difícil encenarmos para os outros a nossa inadaptidão.
O pai e a mãe já cá não estão (pelo menos à mão de semear), os amigos às tantas mandam-nos à merda com o ambiente depressivo que semeamos por todo o lado, etc.
Ao contrário do que é comum nas "crises dos adolescentes", os adultos não têm qualquer tipo de condescendência e pachorra para os tão adultos nas crises de identidade.
O comportamento de alerta passa a ter leituras psíquicas de índole marginal e as "fugas personalistas" propriamente ditas, leituras apocalípticas e ameaçadoras da integridade de todos.
Ou somos crianças ou somos malucos! As crianças crescem e os malucos tornam-se ameaçadores!
Hoje parece-me que quando era adolescente foi bem mais fácil encenar os dramas do meu crescimento, a começar por este registo de diário que aos 35 anos ainda pratico gulosa!

domingo, outubro 23, 2005

«Ler é para as pessoas que têm muito tempo e nada que fazer»

- É o que eu digo. Como as mulheres. Quem tem de trabalhar não tem tempo para histórias. Na vida é preciso mourejar. Não acha?
- É uma opinião. Procurava alguma coisa em especial?
- Não é uma opinião, é um facto. É o que se passa neste país, que as pessoas não querem trabalhar. Muito vadio é o que há, não acha?
- Não sei, cavalheiro. Talvez. Aqui, como vê, só vendemos livros.

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O indivíduo aproximou-se do balcão, com o olhar sempre a revolutear pela loja e poisando ocasionalmente no meu. O seu aspecto e a sua postura eram-me vagamente familiares, embora não soubesse dizer de onde. Havia qualquer coisa nele que me fazia pensar numa daquelas figuras que aparecem em cartas de antiquário ou adivinho, uma personagem fugida das gravuras de um incunábulo. Tinha a presença fúnebre e incandescente, como uma maldição com o traje domingueiro.
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- Se me disser em que posso servi-lo...
- Quem lhe vinha prestar um serviço a si era eu. O senhor é o proprietário deste estabelecimento?
- Não, o proprietário é o meu pai.
- E o seu nome é?
- O meu ou o do meu pai?

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O indivíduo endereçou-me um sorriso zombeteiro. Uma cara de páscoa, pensei.
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- Depreendo então que a tabuleta de Sempere & filhos se refere a ambos.
- É muito perspicaz. Posso perguntar-lhe qual é o motivo da sua visita, se está interessado num livro?
- O motivo da minha visita, que é de cortesia, é avisá-lo de que chegou à minha atenção que os senhores têm relações com gente de má vida, em particular invertidos e meliantes.

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Observei-o atónito.
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- Perdão?
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O indivíduo cravou o olhar em mim.
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- Falo de paneleiros e ladrões. Não me diga que não sabe do que falo.
- Lamento dizer que não tenho a mais remota ideia, nem qualquer interesse em continuar a ouvi-lo.


O indivíduo assentiu, adoptando uma atitude hostil e irada.
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- Pois vai ter de gramar. Suponho que está ao corrente das actividades do cidadão Federico Flaviá.
- Dom Federico é o relojoeiro do bairro, uma excelente pessoa, e duvido muito que seja um meliante.
- Eu falava de paneleiros. Consta-me que essa bichona frequenta o vosso estabelecimento, suponho que para vos comprar romancecos românticos e pornografia.
- E posso perguntar-lhe o que o senhor tem com isso?

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Por única resposta extraíu a sua carteira e estendeu-a aberta sobre o balcão. Reconheci um cartão de identificação policial emporcalhado com o semblante do indivíduo, um tanto mais novo. Li até onde dizia «Inspector-chefe Francisco Javier Fumero Almuñiz».

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Excerto de A Sombra do vento, de Carlos Ruiz Zafón (Dom Quixote)

sábado, outubro 22, 2005

O enguiço televisivo de Carrilho que nem a BÁRBARA safou (*)

«Quente... quente...
Já estão a lembrar-se de alguém do seu conhecimento, com quem lidaram, com quem viveram, parente, amigo, vizinho...
O
Dicionário de Morais explica-o assim: "Enguiço é o mal que se causa de ser olhado por algum torto ou outro qualquer acidente" Até aqui, o mais notável é ele chamar aos tortos, 'acidentes'.»
(Das loucuras e das manias em Portugal, Júlio César Machado - 1871)

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(*)
Agradeço a
JUMENTO.BLOGSPOT.COM, a imagem que desonesta e escandalosamente este blogue sacou(!!!!) para exposição em escaparate e à amiga que pertinentemente ma revelou

sexta-feira, outubro 21, 2005

Uma emoção tão inesperada quanto ALICE no cinema!(*)

Disfarçada pelos verdes do pilar translúcido da Wireless Internet Zone e da pigmentação de uma Aucuba Japonica, bem no meio do parágrafo sagaz das «figuras miseráveis a observar-nos, com olhares que iam da curiosidade ao temor e, num ou outro caso, à cobiça» surgiu-me o inesperado.
Estava recostada e contrariando todas as regras da "anatomia-sentada" numa palhinha do Monumental quando invade-me o quase metro e meio íntimo (uma teoria sobre a Espacialidade Íntima que cada um de nós arrasta no espaço físico que ocupa) a presença alteada de Nuno Matos.
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- Alice! O pai de Alice! - Foi tudo o que fez eco em mim e desejei reproduzir em sentimento, mesmo perante as palavras perturbantes que ocupavam a Barcelona da leitura.
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Descaradamente sorri e nem me levantei tal era a obstinação. Chamei-o a mim num timbre tímido que só reconheço quando a voz é vítima da espontaneidade descontrolada e sem preparação para estranhos, como no ano passado no fim da conferência de Paul Auster na Fnac e com o seu último livro tão presente na memória como este preciso momento blogosférico.
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- Desculpe-me... Sei que já tem 6/8 meses para si, mas eu vi-o há 15 dias e, permita-me... Adorei, gostei muito, muito mesmo... - Aqui não se nota mas foi um autêntico gagueijo vocálico.
- Obrigado.
- Gostei muito. Desculpe-me. - E lembrei-me que não permiti a ninguém dos meus que "fizessem que não soubessem" ao ponto de minha mãe sair aflita do cinema para ligar o telemóvel e dizer-me que «Nunca, nunca mais, recusarei um papel na rua. Que nunca mais violentarei alguém com a minha indiferença à sua abordagem»... - Desculpe-me, gostámos todos muito... muito mesmo. A minha mãe até ficou envergonhada com os outros que não quis ler na rua...
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Nuno Matos anuíu com a cabeça, deu-me o que pareceu também um desejado agradecimento e um sorriso de simpatia. Inesperadamente, debruçou-se com amplitude sobre a mesa e sobre a teoria do americano que já não me lembro o nome e onde eu continuava recostada:

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- Muito obrigado... pode ser que algum dia a conheça - Disse-me.

- Obrigado... - Respondi-lhe e afaguei o livro aberto entre as mãos.
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O actor despediu-se e propus-me a mais 20 minutos de leitura. Não consegui. Quedei-me sensibilizada pelo ambiente concentrado que se gerara de repente entre todos: o pai da Alice, a atmosfera da flora que faria inveja à Scheflera lá de casa - que mais parece mirrar de tristeza do que crescer arrogante já que rainha daqueles domínios - e eu, na representação de quase 20 mais que se perturbaram sem tomar bem a dimensão do transtorno do pai da Alice, de Marco Martins.


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(*) Isto é o que vos posso contar sobre Alice e Eu. O mais, terão que ir vê-la...

quinta-feira, outubro 20, 2005

Paradoxos do género feminino na RTP1, às 23h15m

A maioria das mulheres têm o complexo de Cinderela (o enamoramento e a côrte por um belo e afortunado homem), no entanto, imagino que poucas poderão negar - em honestidade - que nas suas fantasias também vagabundeiam românticos intensos e loucos como Jack Nicholson.
O carteiro toca sempre duas vezes é, para mim, uma das histórias perfeitas sobre amantes e amor "puro e duro" - o eros IMPREVISÍVEL, INCONSEQUENTE, INJUSTO, ERÓTICO e de carácter AUSTERO.
Se se agradaram com a comédia de Um amor inevitável (Steven Gaghan), se se perturbaram com o maravilhoso Disponível para amar (Wong Kar-Wai), então revejam este intenso e não menos sedutor romance 'negro' de David Mamet.

quarta-feira, outubro 19, 2005

A coqueluche de Sócrates no OE 2005/6

DESENVOLVER no contexto europeu significa, na maioria das vezes, investir com uma taxa de esforço reduzida na medida em que os programas comunitários baixam o risco de perda ou não recuperação caso se dê o insucesso.
No caso de finanças débeis como a nossa, exceptuando a tradicional participação pública ou empresas estatais de sectores estratégicos (como as da energia e comunicações que foram sucessivamente privatizadas e obrigaram a redistribuir as maiores fatias do bolo para os privados em vez do próprio Estado que tanto precisa), dificilmente se vislumbram outras realidades económicas para exploração.
O novo aeroporto da OTA e o TGV (XVII Programa Constitucional do Governo) decorrem, acima de tudo, de explorar uma verba comunitária que doutra forma depois de 2009 nunca mais poderíamos resgatar (QCA - Quadro Comunitário de Apoio na área de coesão dos transportes).
Parece claro que interessa mais a Sócrates absorver estas ajudas que a dar-lhes coerência nos percalços económicos e estagnados da situação actual do país. Para não falar do impacte ambiental da Otinha que desde 1999 constitui uma grande interrogação pelo que implica.
O governo está decidido em aproveitar os 30% financiados pelo PIEP comunitário (Programa de Infra-estruturas Prioritárias) e, se for preciso, correr o risco de aumentar o défice português pelos avultados 70% que lhe competem da cofinanciação.
Parece cego e nem se permite à discussão séria do que está em causa. Se uma "infra-estrutura prioritária" que não se pode adiar porque hipoteca a médio e longo prazo o desenvolvimento dos meios económicos, se uma "infra-estrutura prioritária" que não lesa se Portugal ponderar a não realização dela.
No caso concreto da OTA e do TGV (projectos com a duração mínima do mandato socialista, portanto Sócrates nunca gozará de algum 'azar estrutural e financeiro' se não continuar em governo nas próximas eleições), o que está em causa é o desperdício e abandono evidente do actual aeroporto de Lisboa (nos últimos anos sujeito a modernizações que não devem ter implicado valores propriamente simbólicos) e o esbanjamento de um investimento demasiado alto para o OE 2005/6.
Um preço demasiado alto a pagar para o eixo de transportes e comunicações de Portugal-centro da Europa, mesmo depois de ponderadas as mais-valias da sua centralização a outros acessos rápidos do país e proximidade com os eixos fundamentais da circulação entre Portugal/Espanha.
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Na altura, os governantes farão um brilharete digno de pompa e circunstância e haverá autarquias preocupadas com os privilégios que perdem da proximidade física aos eixos principais e os mercados económicos a eles associados (e por eles estabelecidos) e autarquias que não esperam por ver o que ficarão a ganhar na mesma proporção pelo que se oportuna do novo reposicionamento geográfico.
Ainda nesta sequência simplificada, resta a população em geral e a recta final destes altos vôos.
No caso do TGV, outras questões há que não no aeroporto da OTA. Como as dúvidas de investimento numa rede de comunicações de grande velocidade que não é compatível com o resto da malha ferroviária e nem perfilha a tendência constante do abandono deste transporte de longo-curso, caro demais para ser alternativa aos pequenos aeroportos ou viaturas automóveis.
Só a CP nos últimos anos têm encerrado e desmantelado vários quilómetros de linha ferroviária não sustentáveis pelo uso pouco corrente das populações à volta (não contando com os movimentos desertificadores do interior para os subúrbios urbanos) e pela massificação da viatura própria facilitada pelo crédito bancário.
O trunfo de Sócrates está indiscutivelmente no factor emprego que tem relevância nestas obras e mão de obra que implicam. Um oásis operário desejado por todos, mas durante quanto tempo?
E depois?
Depois voltarão todos ao desemprego...
Depois as empresas desse consórcio (que nunca serão as pequenas e médias verdadeiramente necessitadas destas bolsas de oxigénio) retomarão o ponto médio de labor pontual nos empreendimentos imobiliários e industriais...
Depois o marasmo empresário não está garantido que não regresse e repesque novo IVA para tributação...
Depois os portugueses poderão verificar que não usam mais avião do que já faziam e ainda têm para pagar uma dupla despesa de dois aeroportos a coexistirem...
Depois, a minoria empresarial que fazia o uso ferroviário rápido terá o TGV em vez de optar pelo avião mais rápido ainda...
Depois, outra minoria empresarial que fazia uso do aeroporto de Lisboa terá a Otinha para alternar com a namoradinha...
Depois, outros como eu poderão divertir-se esporadicamente num passeio fora do comum no TGV (que nem em Paris usei, tão eficazes e económicos são os comboios de lá)...
Depois acabo por não fazê-lo porque, ao contrário dos velhos e humanizados comboios, descubro que os cães "não têm assento"...
Depois Sócrates faz um brilharete e, a seguir, vai tentar convencer-nos e à Comunidade Europeia que Portugal recuperou a auto-estima e está na rota dos países tecnológicos.
Um país que vê aumentar o seu índice de pobreza, MAS TÊM O TGV, A COQUELUCHE DE SÓCRATES!

terça-feira, outubro 18, 2005

O êxodo outoniço das autárquicas


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Todos os sufrágios são diferentes, exceptuando quem faz a razão da sua existência e que são os quase 1300 eleitores daquela secção de voto - neste caso a n.º 6 da Freguesia de São Jorge de Arroios, abancada no ultrapassado e desconfortável Pavilhão de Física do Liceu Camões.
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São diferentes os ideários políticos...
[Em campanha, todos em uníssono exortam o cidadão como o verdadeiro instrumento para completar e legitimar o que cada partido entende da democracia ao serviço do povo:
- «Um voto, uma mudança»
- «Um voto, a diferença»
- «Um voto, um valor».
Repentinamente no quotidiano viciado, todas as classes em comunhão e brio nacional, sem que seja certo para os deste lado que entre cada cruz de voto na urna e cada cruz que oficializa o cargo, esse propagado sentimento da cultura de serviço permaneça sem mácula]
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...Como os candidatos.
[Os slogans mudam em cartazes tendencialmente mais pobres em fisionomia e estética. Mas se tudo anda tão mais pobre...
São caras novas de passe digitalizado na pelintrice caseira ou caras caquécticas do que a Reforma ou o Desemprego de longa duração deixa ainda disponível para aparentar de eficiência e de dinamismo.
Os candidatos mais jovens alternam entre o doutoramento arrastado pela falta de perspectivas e a sindicância breve do ginásio no Verão.
Os candidatos em banho-maria etário - quão feios que somos, senhores!!!!! - há-os indiscutivelmente sedentários na política e os sedentarizados numa dimensão cívica agora ultrapassada pela nossa Era tecnológica]
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É diferente o ano, como é diferente o número oficial do sufrágio.
[Até a fita-cola - caramba (!!!) - cada vez mais rasca.
As esferográficas de agora, não se percebe, não sabem imitar as verdadeiras e de produção nacional: as excelentes BIC.
Caramba, a mim falhavam nome sim, nome não, como imagino que fosse também a sequência de defraudados eleitores.
Os objectos simbólicos que imortalizavam naquele momento quem participava nestas assembleias (ainda a República dava tesão aos populares), não foram excepção, como a vela do carro desenrascada pelo Presidente para lacrar os documentos oficiais.
Talvez porque a democracia portuguesa já tenha derrubado uma ditadura e extirpado uma guerra colonial, não sei. O cunho personalizado do gesto que antigamente produzia espantosos sinetes já pouco importa na prática banal de legislativas, de autárquicas e, agora tanto na moda, dos referendos!]
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São diferentes os delegados partidários.
[Salvo excepções, são normalmente de vida mais que sufragada e arrastam pelas quase 14 horas que lá estão, a mesma sonolência da urna preta quando abre a boca no fim e não dá novidades.
Um tão velho quanto a fama do seu partido e - provavelmente - ali pelas mesmas razões que o do ano passado. Ficou viúvo há pouco tempo e os seus dias pouco ou nada calóricos tornam-se insuportáveis quando não há jogatanas de copas no Jardim Constantino ou jantares de associados nos Bombeiros da freguesia.
O outro, mais velho ainda, o seu pai participou na II Guerra e ainda se lembra (lembrar-se-á mesmo?) de assistir à inauguração do primeiro monocarril em Lisboa que conseguiu patinar até Alcântara, apesar da débil parelha cavalar que o puxava.]
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É diferente quem preside e o coadjuva a orientar todo o grupo de carolas organizado pela CNE.
[Um dia, noutras eleições, um escrutinador fizera a curiosa analogia: «Não estamos nós num exercício simbólico de governação? Reparem, temos o Presidente, o seu Vice e nós: os tarefeiros da modorra democrática».
Tudo, para ele, um retrato rigoroso do modus faciendi dos governantes deste país, ou seja, uns Acima e uns Abaixo.
Os Acima assinam, credenciam e legitimam o exercício dividindo a sua atenção entre fair-divers ao telemóvel e a tecnologia do Forno Philips que juram «ser mais inteligente que os próprios».
Os Abaixo são quem sobeja e suam gélidos só na desconfiança de terem trocado a dezena do n.º de eleitor.
Sabem que vai significar um milhar recontado uma, duas e três vezes, até que os Acima se fartem e, para que as percentagens pareçam razoáveis à CNE, sacam logo uma engenharia contabilística que permita a todos ainda jantar acompanhados ou ver o Herman pornográfico da TV.
Se bem me recordo, só quando Guterres e Sócrates se enganaram no PIB ou no Défice é que não fez mal. Um erro humano inofensivo porque sem efeito para a acta - a da governação.
Não importa. Nunca importa se é coisa séria, porque as contas deles não precisam de bater com as nossas contas. Esses estão Acima e nós Abaixo, logo os números são outros.]
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São diferentes os boletins de voto, os documentos afins e até as regras do jogo.
[Há quatro anos os boletins (cuidadosamente dobrados em quatro, não vá o papel grosso e de toque desagradável ainda transparecer o vaticínio em causa) só podiam ser manejados à boca da urna pelo Presidente.
Este ano, a CNE entendeu por bem sublimar o ritual do voto e passar o direito depositário ao próprio eleitor.
Novos, velhos, sabidos, amadores, todos chegavam para requisitar a sua propriedade e o ónus da participação cidadã. A seguir recolhiam-se para o auto de fé e, à boca da urna, exerciam calmos a condenação ou a salvação das almas em questão.
Este ano, com a nova liturgia de escrutínio, quedavam-se que nem tontos face ao Presidente que sorria e anuía com a cabeça.
Eles sorriam gratos e o Presidente envergando os papéis aflitos anuía novamente. Os escrutinadores miravam insistentes para o eleitor e, na maioria das vezes, antes da mesa explicar em jeito condescendente o que se (não)passava, o cônjugue ou o acompanhante do eleitor gritava lá de fora:
- Mete na caixa. Vá, mete na caixa preta!]
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Todos as eleições são diferentes, excepto eu que não mudo de barraca - neste caso a n.º 6 de São Jorge de Arroios, abancada na reduzida e incaracterística sala de aulas, supostamente um laboratório de ciências para os alunos do afamado liceu.
Este ano o meu Presidente não era um Bombeiro grande e não teve que levar pelo ar um marido retrógrada que queria votar por ele e pela mulher.
Este ano o meu colega escrutinador não era a Ana, mas o seu marido que insistia na estupefacção de eu conseguia ler Carlos Ruiz Zafón entre a comunidade chinesa que não proferia sequer um monossílabo camoniano mas - ainda assim - votava, e nós deste lado de cá. Em concreto o Presidente e a secretária que se devem ter pequeno e almoçado a si próprios, tão juvenis eram as inocências tácteis entre si.
No entanto, para lá das contas baterem todas certas, para lá dos candidatos que venceram serem invariavelmente os mesmos (e nunca o meu!!!!) e continuar a ser um grande frete esta ’coisa’ cívica, este ano o vice era um autêntico output de fresca e sedutora presença entre os velhos e os usados.
Ao contrário do que seria de esperar, o representante do Bloco de Esquerda (um informático seguro dos seus quarentas) não tinha pilosidades capilares quase até aos ombros, não usava têxteis revivalistas dos anos 60, não discursava o marxismo indeciso do Louçã e nem se propunha um remédio milagroso à custa da Esquerda dé javu e da Direita "já lá vou".
Todos as eleições são diferentes...

sexta-feira, outubro 14, 2005

Coincidências: realidades que “coincidiram” umas para as outras e que ganham um novo significado


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«Quando tomamos consciência da nossa tarefa, mesmo a mais apagada, somente então seremos felizes. É então que podemos viver em paz e morrer em paz, porque aquilo que dá um sentido à vida, dá um sentido à morte»
(Saint-Exupery)


Conheço um tipo que descobriu a sua última paixoneta quando o asfalto da Lapa engoliu um autocarro com ele lá dentro e este viu-se obrigado a abraçar uma jovem aterrada até a polícia os libertar estoicamente pela janelinha do condutor, a única que se abria por fora.
Neste momento o casalinho vive uma paixão atribulada e o consenso conjugal está suspenso pelos fios subjectivos da “coincidência” da Lapa.
Não há quem os convença que a maioria de nós é uma insignificância nesta embrulhada da civilização e que as aventuras proféticas não são para qualquer um dos quase 10 milhões de portugueses.
Mesmo quando elas acontecem, poucos poderão gabar-se de elas terem sido verdadeiramente determinantes no seu percurso pessoal.
O casalinho já não existe como tal, mas não ata nem desata, preso que está na sua romântica e dramática primeira apresentação que não querem «desperdiçar, porque não pode ser só uma coincidência».
Quando estamos perante determinados acontecimentos que não têm qualquer relação entre si, mas por razões ilógicas entendemos forjar-lhe uma, chamamo-lhe "coincidências" - realidades que “coincidiram” umas para as outras e que ganham um novo significado.
Mas só são “coincidências” a partir do momento em que revelamos essa realidade a alguém. Como se tivéssemos de justificar racionalmente alguma coisa a esse outro. Como se mais nada pudesse ser válido sem cientificidade e, nesse pudor racional, seja motivo de vergonha dar importância às regras aleatórias do “caos”.
Chegamos mesmo, na presença de alguém mais antagónico aos "acasos", quase sempre a optar pela negação e dizemos qualquer coisa como «não há coincidências na vida, meu amigo», sem conseguir esclarecer o que quer que seja.
Portanto - para não sentir o embaraço - tratam-se de “coincidências” se duvidamos de nós próprios e, se duvidarem de nós, tratam-se de “não coincidências”.
De qualquer das maneiras, impera o princípio de que nada é casual e tudo tem uma razão de ser. Não sabemos bem o que é que significa, mas SIGNIFICA e temos de categorizar qualquer coisa para justificar o DESEJO ou o PRAZER que nos faz invocá-las.
Talvez por limitação intelectual, simplicidade de género ou inteligência rudimentar (deixo isto à vossa consideração), cá em casa, só há um modo cognitivo. Qualquer conteúdo (informação) válido tem de passar pelo mesmo crivo básico de conhecimento: primeiro o destrinçar da realidade em moldes racionais e comprovados, e depois a formulação verificável dessa mesma realidade.
Se tal não for passível desta fórmula considero estar perante factores e variáveis indecifráveis ao pensamento comum.
Assim, quando me acontecem coisas que não tenho como classificar e guardar transparentemente, nessas alturas vale-me sempre a ambivalência desse mundo imenso que é a Estética (que vai do belo ao grotesco) e onde podemos “enfiar“ quase tudo do que somos. Incluindo a espiritualidade e o misticismo que não tenho, mas que alguns amigos insistem que abrace serenamente nos dias de melancolia desesperante.

O Homem vive num tríptico ético lixado e que consiste em encontrar o entendimento viável entre a sua razão, a sua emoção e a acção enquanto indivíduo que preconiza com os demais.
Quando o imprevisto da “coincidência” tropeça em nós, das duas uma, ou o encaramos como pertença do caos organizado da vida que não interpretamos por limitação ou desejo, ou entregamo-nos à sua evidência ainda que misteriosa.
Os anos de 2004 e 2005 têm sido particularmente “particulares” cá em casa, onde habito simples, solitária e doentiamente noctívaga.
Quase posso afirmar que têm sido meses de descobertas tão dolorosas quanto maravilhosas.
Por exemplo, tenho dois amigos novos e o casal que constituem como que me reposicionaram afectivamente em relação ao mundo humano. Puseram-me, inclusive, a questionar-me a mim própria como “entidade” geradora e não mera “individualidade” sedimentada.
Hoje, pergunto a mim mesma se a fertilidade do desejo ou a dor da sua ausência são sentidos de acordo com a intensidade com que os observamos nos outros ou de acordo com a medida em que os temos cá dentro...
Se é consoante a nossa realidade ou a que nos extravasa...
Nos dias de hoje questiono-me como nunca o fiz e bem posso agradecê-lo a Alex e Tim, pois experimento o seu amor poético que inspira em mim e no Bocadosdegente um alterego fundamental para o meu crescimento individual e protege-me de alguma insanidade romântica.
Quando criei este blog, entusiasmada por homens das letras, permiti ao mundo estranho que me conhecesse “diferente” e, para minha surpresa, fiz dos hábitos velhos da leitura e da escrita que me acompanham desde muito nova, alavancas para deliciosas “coincidências”.
Se tenho vivido várias “coincidências” felizes, bem posso agradecê-lo ao casalinho do Carmo e à sua beleza que não quero «desperdiçar, porque não pode ser só uma coincidência», tão gratificante e completa que ela é.

quarta-feira, outubro 05, 2005

E imaginei o meu pai na mesma posição de apoio de meu avô...


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Quando a lua entrou na sombra cá de casa, não a recebi. Quedei-me firme na umbra do quarto e na nostalgia materna dos lençóis que, ainda hoje, muitas manhãs desejo que me destape e, doce, me enxote para a violência da luz lá fora.
Quem - como eu - não comunga no sono a serenidade da pausa, só permite ao leito o estatuto de exílio quando mais nada se presta.
E, ainda assim, só mesmo a MINHA cama que está imaculada de solidariedades outras que não as velaturas inconfundíveis dos aconchegos de mãe. Ou dos pais, se quiserem.
Para mim, dispenso o género masculino nessas mãos que enxotam por que vela sempre o meu recolhimento A de meu pai. À minha cabeceira, ou melhor, à cadeira que faz-de-conta, pousa madura, orgulhosa e esculpida em gesso pelo próprio e com a confiança de um placebo.
Há homens que nos arrebatam o coração e homens que nos arrebatam a cama. Um pai que se preze confia-nos a ambos e apenas deseja que saibamos "dormir sobre cada assunto como gente grande"!
No dia anterior tratei de comprar os óculos Sky & Space munidos do tal filtro «que nos permite a observação directa do sol sem perigo» e protege os olhos da exposição «conquanto sejam utilizados correctamente».
Por razões outras, que não as de curiosidade astrofísica ou mística enfeitiçante associadas a este fénómeno da lua, este ano estava decidida a violar o repouso entre as 9:00 e as 11:00 (único período de descanso que a insónia crónica ainda não arrebatou) e assistir da alta janela da sala aquela dança amorosa de um corpo esférico entrando na sombra de outro também esférico.
Talvez a metáfora mais perfeita de Dois Num Só sem que a grandeza ou pequenez de cada individualidade seja obstáculo para a união, como a cumplicidade particular com meu pai.
No último eclipse solar que presenciei, encontrava-me no cimo da Serra do Marão (sexta maior elevação de Portugal Continental) e acompanhada por dois filhos da terra transmontana, meu avô e meu pai, o seu filho mais velho.
Por minha sugestão arrancámos juntos e na bisga de Lisboa para a aldeia de Fornelos, encantados pela ideia de oferecer o primeiro e provavelmente o último eclipse solar a meu avô. Um duriense muito velho que de fenómenos só conhece os da mitologia popular, como as formas sugestivas da cumieira do Marão que diz ser uma jovem rapariga deitada e chorando os desamores por um marialva sabido que pela aldeia passou um dia.
Amparados, recordo disputar-mos durante os 7/8 minutos do "caminho do eclipse", uma minúscula radiografia do tornozelo desfeito de meu avô, sem que déssemos pela ruína que morava ali naquele substituto óptico. Para as gentes do campo, não há fenómenos que compensem apartarmo-nos do trabalho da vinha ou do azeite, nem sequer as romarias religiosas de cor e cânticos luxuriantes tão típicas dessa região.
Um camponês morre duas vezes: a primeira quando deixa o amanhar das terras e a segunda quando o Nosso Senhor o decide levar para o Céu.
Enquando a lua tentava entrar na penumbra cá de casa, corri a telefonar para meu pai a quem foi diagnosticado um glaucoma agudo sem qualquer hipótese de intervenção cirúrgica.
Quem atendeu foi minha mãe. Disse-lhe que tivesse cuidado com os Sky & Space que advertiam para usos indisciplinados e aconselhavam «a utilização contínua a frequências com uma duração máxima de 3 minutos, assim como o tempo de descanso de 30 segundos».
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- O teu pai ficou à janela a olhar para lá... eu ainda tentei dizer-lhe...
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E imaginei o meu pai na mesma posição de apoio de meu avô que há meia dúzia de anos na Serra do marão... desta vez à janela e não a 1415 metros de altura... também anestesiado pela beleza daquele "anel de diamante" magnífico com a largura de 270 Km... porque podia ser o último eclipse solar - genuíno a olho nu - antes do outro... o da cegueira.

terça-feira, outubro 04, 2005

Ist's wonderful...

That «girls just want to have sex!»,
because men's dont know how to live with out it!
Saúde! (Para quem bem sabe)

segunda-feira, outubro 03, 2005

«Não faças o que eu faço, faz o que eu digo!»

Sem meias medidas, Sócrates acabou por meter o pé na argola.
Ao mesmo tempo que favorecia várias colegas em transferências estatais (mantendo-os com emprego e bem pago como no caso das nomeações para a Caixa Geral de Depósitos e as reformas no Banco de Portugal), desancava forte e feio nos poucos direitos sociais (a maioria do pós-25 de Abril comunista/socialista) que restam aos que não participam de grosso modo da riqueza nacional, mas sabem que o sacrifício das suas contribuições fiscais, mais tarde ou mais cedo, poderão garantir-lhes um fim de vida activa condigno (em Portugal paga-se muito para a Segurança Social e Impostos comparativamente aos valores líquidos dos vencimentos e ao retorno através dos serviços públicos na generalidade).
A «estratégia do crescimento português para a próxima década» do programa socialista revela um novo posicionamento político-social para o país.
Um estado que pretende cumprir cegamente as quotas e os programas comunitários (como a PAC ou os fundos de emergência indiferenciada que não usa para aguentar uma fonte de receitas eterna), sacrificando o que tiver que ser e desvinculando-se do seu papel social não lucrativo em prole de mais-valias outras (que não a qualidade de vida concreta dos cidadãos na saúde, educação, formação profissional e científica, emprego, ciência, cultura, etc).
Assim, José Sócrates irá, com certeza, reduzir despesas para poder mais tarde reunir orçamento para investir:

  • alterando o sistema de saúde dos militares que os obriga a recorrer a serviços externos, POUPA DINHEIRO E REÚNE RECEITAS!
  • aumentando o IVA dos empresários que o recuperam no consumidor, POUPA DINHEIRO E REÚNE RECEITAS!
  • aumentando o tempo de reforma e penalizando reformados/trabalhadores, POUPA DINHEIRO E REÚNE RECEITAS!
  • reduzindo a comparticipação nos medicamentos, POUPA DINHEIRO E REÚNE RECEITAS!
  • transformando os hospitais em SA‘s, POUPA DINHEIRO E REÚNE RECEITAS!
  • reinventando as chefias das empresas públicas com as candidaturas de confiança política, POUPA DINHEIRO E REÚNE RECEITAS!
  • cortando nos orçamentos do Ensino Superior, POUPA DINHEIRO E REÚNE RECEITAS!

O governo socialista, até agora, só tem dado golpadas deste lado, o do Zé povinho. Hoje as manchetes dos jornais alertam-nos que Sócrates vai morder um bocadinho mais, cortando na percentagem das reformas. Assim, POUPA MAIS DINHEIRO E COM CERTEZA REÚNE OUTRAS RECEITAS!
Resta-nos ver, mas adiante, que investimento o Estado fará com toda a liquidez que arranjou por cobrança ou poupança.

domingo, outubro 02, 2005

Sexo-Expresso (XXVII) ou O sexo adaptado

Adaptar as modernas tecnologias - como a realidade virtual - para o sexo stressado da modernidade. Curá-lo ou, pelo menos, tentar suavizar as suas contrariedades face aos novos desafios, poderia ser um novo processo terapêutico da Psicologia.
Como adaptar o sexo "antigo" à sexualidade moderna?
A ideia começa precisamente na mesma sala comum a qualquer consulta de psicanálise e onde o paciente aguarda o médico num confortável divã, só que agora na presença de uma parafernália de peças e fios ligados a um pequeno monitor.
O tratamento consiste em obrigar os pacientes a recordar as suas experiências eróticas como sempre o fizeram no passado recente, mas que hoje se bloqueiam e expressam através de emoções brutalmente perturbadoras e negativas onde as coisas aparentemente simples já não o são (como chegar a casa primeiro que a mulher e jantar sozinho e em silêncio com os filhos que não entendem a sua melancolia; tomar banho sem que a voz feminina lhe sugira uma erecção quando pergunta lânguida se ele precisa que lhe chegue alguma coisa ou visionar uma matiné da TV deitado sobre o sofá e onde o corpo só sente a dureza do comando ao invés do calor e peso das pernas ao lado que se estiram sobre ele).
As exigências da vida moderna redimensionaram as necessidades íntimas dos homens e das mulheres e (des)estruturaram-nas para partilhas amorosas quase impossíveis porque os intervenientes - os amantes - continuam com a sua dimensão afectiva tradicional e "à antiga" mas numa nova dimensão temporal - a do imediato.
Para combater os inevitáveis recalcamentos e entraves nas relações, os médicos recorrem a imagens encenadas da hipotética comunhão doméstica "perfeita e harmoniosa" e confrontam in loco as desordens do stress pós-traumático sexual.
Nos dias de hoje temos que nos reajustar pessoal e eroticamente quando pressionados pela velocidade em geral da sociedade. E, para o desempenho de uma sexualidade sã, não só é difícil como não está garantida uma vida íntima sem depressões, insónias, ansiedade ou desordens de comportamento social mais perigosas.
A experiência da virtualidade é, pelo menos numa coisa, inovadora na medida em que se pode identificar o trauma do paciente em concreto e com objectividade. Mais que identificá-lo imediatamente nos filmes que se passam, pode-se também verificar na própria experiência as verdadeiras alterações emocionais e fisiológicas porque passa o paciente quando confrontado com a contrariedade em questão.
Não se faz nada de novo em relação aos métodos clássicos da psicologia: desenterrar memórias latentes e aparentemente passivas, só que com novos instrumentos de trabalho. Além disso tem vantagens porque dá mais precisão à importante primeira fase do tratamento que é a recolha rigorosa dos dados para interpretação médica.
Com os homens - em particular - talvez seja mais fácil encarar os seus estigmas e virilidade de "macho" posta em causa. Pô-los a falar e encarar com o médico aqueles dramas que todos conhecemos (ejaculação precoce, impotência temporária, etc) e nunca eles.
Usamos a tecnologia aliada à pornografia como terapia da psicanálise. Isto é só ficção, mas que os homens andam tristes... Ai se andam....
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«A mãe fala mas ele não a ouve.
Está concentrado a olhar Jesus que está desde sempre crucificado sobre a porta da cozinha. Não reparava nele há tanto tempo...
Lembra-se de com doze anos descer a escadas a meio da noite e vir masturbar-se silenciosamente em frente ao divino corpo desnudado.
Agora a olhar para a familiar estatueta pergunta a si mesmo se o desejo que sente pelo miúdo se qualifica como pecado na sua 'escala de valores cristãos adaptados'.
Aqui está ele, finalmente, a sentir-se ridículo.
A suportar duas horas semanais de pura tortura física, moral e intelectual, a falar de Kant e Hegel e mal se atrevendo a levantar-se da secretária com medo de ser traído pelos súbitos ataques de tesão que lhe dão cada vez que se descai a olhar para ele, Olhos de cão.
Quase se sente cientificamente curioso por ver a sua própria reacção quando ele finalmente falar na aula e lhe fizer perguntas.
(...Não mãe, obrigado, não quero mais batatas.)
Depois do medo que lhe surgiu na adolescência de se ver casado, com mulheres e filhos a morar em Massamá ou no Cacém, seguiu-se o medo de se ver 'junto' com 'ele' a passear caniches na praia.
Agora cresce-lhe o medo de se ver no cimo do Parque, com 40 anos, a levar miúdos para casa.
Sim, pai, o que é que eu quero da vida?
(Não mãe, estava óptimo, não tenho é muita fome. ...Sim, estou bem. Estou. ...Não, não tenho ido ao médico, estou óptimo, porque é que havia de ir?. ...Ouve, se começas outra vez com essa história da SIDA é melhor eu ir-me embora... Não, não tenho nenhum namorado novo... Não, não quero mais batatas.)
Oh sim pai, sabes 'muito bem' o que é que eu quero...»
(Excerto de "Olhos de Cão")

sábado, outubro 01, 2005

Para Alegre, José Sócrates foi o primeiro de um conjunto de factores políticos que anunciaram uma nova era no PS

O PS já não é o mesmo... não pode!
Nas eleições para a direcção, João Soares paga a factura do seu trabalho autárquico - ambíguo e de lobbys - e descobre que não sucede ao personalismo de seu pai Mário Soares, o abrilista.
A candidatura de Manuel Alegre e José Sócrates revela um partido de espinha bifída e surgem as primeiras facções de notáveis e quadros cruciais entre socialistas e na sociedade civil.
Colagens à esquerda da Esquerda, colagens à direita da Esquerda, Alegre e Sócrates representam um partido em redefinição e à procura de novo ego democrático entre o socialismo moderado (herdado ideologicamente de Guterres e dos independentes dos Estado Gerais) e a austeridade tecnológica que a direita sempre assegurou como parceiro estratégico dos sectores do capital.
O PS já não deve ser o mesmo...
Perante a maioria absoluta nas legislativas, José Sócrates relança a "independência institucional".
Forma governo com mais de metade dos ministros a pertencerem à militância de cortesia e sem compromissos com as cúpulas do PS e ainda congratula alguns independentes e, como tal, intocáveis.
Agora nas presidenciais...
Terá sido o PS ou Mário Soares que entretanto mudaram?
Contra quem se candidata Manuel Alegre?
Contra Sócrates?
Contra Soares, apoiado por Sócrates que aparentemente não teve tempo de escolher melhor concorrente face ao disciplinado e potencial Cavaco Silva?
Para o PS, o abrilista já não é garante da democracia fiscalizadora como Chefe de Estado? Já não é compatível com o pensamento único do PS e apenas pretende exclusivismo histórico?
Quem é o quê, e o que quer?
«É inútil reescrever a história ao sabor das conveniências e tácticas do momento ou de meras jogadas politiqueiras. O PS não entra nesse jogo. Por uma questão de princípio. Porque não precisa. E porque nas horas decisivas, com Mário Soares à frente, esteve sempre onde era preciso estar» - Manuel Alegre aos deputados da Assembleia da República, 1996