terça-feira, agosto 09, 2005

Eu desconfio que o Professor está sem candidato que o "ofusque" e "com quem se deia bem"!

Um intelectual de formação económica e catolicista (1) com 'poleiro' semanal no Diário de Notícias, desculpa-se com as próximas eleições autárquicas e legislativas para:

  1. se desencantar da geração política do Portugal pós-25 de Abril («O nosso problema actual é que foi essa elite que concebeu, ao sabor de ideologias, a Constituição que regula todos os poderes») em legítimo direito, mas omitindo desonesto nas suas reflexões que, afinal, essas ideologias são o corpo das doutrinas e visões-de-mundo dos individíduos todos que, desde essa altura, vêm sendo orientadas nas acções sociais, incluindo as do colunista!
  2. responsabilizar directamente essa elite pela crise actual e a herança da sua história intelectual («O nosso problema actual vem do poder que essa elite detém, no Parlamento e no Governo»). Ora, nós e Ele temos a consciência que essa mesma história é precisamente do domínio de todas as mentalidades. Todas, incluindo a sua!

Temos aqui um profissional catedrático do Ensino Superior Privado (a Universidade Católica só possível depois de Abril de 1974) que goza de toda a liberdade para fazer uso do seu intelecto(!), reflectir(!) e especular(!) sobre uma classe dominante no nosso país (que lhe chama de 'elite intelectual'). A que para si «nunca fez nada» porque «a acção desembaraçada do povo é que conservou Portugal e o projectou pelo mundo».
O povo que diz dar-se «melhor com a improvisação que com o planeamento, com o expediente que com a organização» e o que «para o bem e para o mal, são o povo do "dá-se um jeitinho", "não há-de ser nada" e "por ser para si, faço uma atençãozinha"».
VIVA O POVO!!!!!!!
Se João César das Neves considera que «Portugal é um país de pessoas, não de ideias» porque «a "Filosofia portuguesa" nunca saiu do ovo», será então caso para perguntar o que as primeiras (as pessoas) ganham às segundas (as ideias) e de que lado é que este intelectual acha então que está.

EU DESCONFIO que precisamente do lado que mais critica severamente, a elite intelectual, porque do lado dos «mais brilhantes e influentes da nossa História que permanecem desconhecidos do grande público», a sua dedicada exposição pública-versada confirma-nos que não, e do lado «do pior da nossa classe política e dos escândalos, abusos e corrupção», não há suspeitas sequer.
Portanto, não sendo claro o que João César das Neves quer politicamente acusar os outros e dada a relatividade que o termo elite encerra (2), só podemos interpretar e reflectir sobre a "tal" que «não é defeito, mas característica».
Ora, a conclusão é ambígua. Porque se essa "elite intelectual", sobre o povo, só «têm escrito bibliotecas a explicar como os traços da personalidade nacional vão ser a nossa desgraça», então não se lhe podem cobrar os nossos problemas!
Ou melhor, a intelectuais como João César dos Neves não podemos cobrar outras facturas, que não as notas das cadeiras do seu "ensino inflacionado" que selecciona ou o PIB que não atina na Imprensa!
Concluindo, porque é que este intelectual afirma que «o nosso problema actual vem do poder que essa elite detém, no Parlamento e no Governo», quando todos sabem que são os seus conterrâneos económicos que lá estão.
O que é que Ele acusa - sem chegar a acusar - de caustinantes e perversas «ideologias»?
Qual é a sua dor «na Constituição que regula todos os poderes» de Portugal?

EU DESCONFIO que, das três, uma:
- ou o professor descobriu-se na classe dominante errada. A que socialmente não controla os processos económicos e políticos em Portugal e não é detentora dos instrumentos e meios sociais para a expansão e desenvolvimento do país;
- ou o intelectual está é sem candidato que o "ofusque" e "com quem se deia bem" porque, como ele bem diz a meio da prosa, «São as legislativas que nos desagradam. Ou, pelo menos, só gostamos delas quando os partidos são ofuscados pelas personalidades, como Soares, Cavaco ou Guterres» (quantas vezes não é a meio das prosas que às vezes está a verdade que se pretende!).

- ou João César das Neves também participou da massiva alienação da "inveja" de José Gil e, como eu, achou comercialmente pouco sério por parte do intelectual! Aí sim, já estamos mais próximos!

&

(1) João César das Neves está ligado a organizações e movimentos sociais da prática católica e do cristianismo "salvador" como, por exemplo, o NÃO ao Referendo sobre a Discriminizalização das Mulheres que Abortam e a produção de livros de contos natalícios para as crianças.
(2) "Elite" é uma referência geral de posicionamento dos grupos institucionais, hierárquicos, partidários, de interesses específicios, etc., em relação às decisões e influências sociais.
No caso da distinção de "elite intelectual", pretende-se a idéia da "formação da opinião pública" e da construção ideológica implícita numa dada orientação política. Mesmo assim, à elite intelectual está associada fundamentalmente a direcção cultural na história social.