sexta-feira, julho 22, 2005

Insucesso escolar = efeitos perversos do Síndroma da Pressa?

O Tempo não está para o homem só como um canal abstracto e aritmético que dita o ciclo das suas tarefas ou como uma alegoria do seu passado, presente e futuro.
Em todas as culturas o Tempo encontra uma simbologia própria e obrigatoriamente associada ao valor social que ele encerra.
Veritas filia temporis - "a verdade é filha do tempo" - implica um princípio, um meio e um fim que há muito [pelo menos desde a década de 50 e o movimento da Primeira Cibernética (1)] já não serve meramente para balizar o "tempo social" do conhecimento e dita os critérios realizadores do "tempo pessoal" de todos nós e que hoje revelam sérias incoerências na sua qualidade utilitária.
As diferentes avaliações do factor tempo ditam as estratégias políticas e económicas e, em consequência, geram teorias para a sua aplicabilidade e possibilidades reais de transformação.
O insucesso escolar é um dos resultados e uma das alegorias modernas desse factor, o Síndroma da Pressa, que nos parece sair muito caro.
Entre todos os agentes de educação há concordância sobre o ideal de entendimento (o desenvolvimento do Estado no sentido de promover o papel da formação do indivíduo altamente dotado), mas não sobre o ideal de sociedade e o espaço vital que ela necessita (as práticas educativas são influenciadas pelas relações sociais do trabalho mas não devem ser prerrogativas das necessidades corporativas do imediato desses grupos económicos).
Ou seja, em acordo sobre os valores cognitivos da educação (realidade do mundo) e em desacordo nos seus valores sociais (a ideologia implícita).
Outra coisa não seria natural. O calendário solar dos políticos é a sociedade produtiva e exige à temporalidade humana rácios de mais-valia com base em resultados transformáveis. Tem no tempo, enquanto critério administrativo e contabilizável, uma bolsa de capitais e metodologias lucrativas.
O calendário do "tempo cultural" tem outras rotações e reconhece o valor natural que lhe é subjacente "à lentidão", ou seja, o mérito na consolidação das estruturas de conhecimento.
Enquanto o discurso oficial é de «metas técnicas e pedagógicas» para o ensino, do outro lado a linguagem dos "pensadores" das universidades e das escolas superiores de educação são «a reflexão sobre as taxas de aprovação e reprovação nas frequências e na avaliação contínua».
Enquanto cada equipa ministerial por cada quatro anos confisca um sem número de percentagens para elaborar os seus relatórios de sucesso, já os agentes no terreno contestam as possibilidades reais das suas fórmulas "embandeiradas" e reclamam o bom-senso: toda a espécie de saber é individual e comunitária. É o auto-conhecimento vagaroso que constrói a capacidade humana rápida nos seus contributos para a história.
Praticamente todos os programas de Governo e seus representantes revelam-se a antítese empresarial na educação portuguesa.
Para praticar a ciência do conhecimento no seus vários segmentos (neste caso a escola), interessa que a estratégia preveja não só a sua realização em critérios contínuos de tempo, como a identificação do seu valor social na realidade longínqua que se deseja construir.
Como o tempo circunscrito a um mandato só permite diletantismos nas reformas educativas e para as saídas profissionais (o panorama actual das economias europeias não visa a recuperação económica em poucos anos), José Sócrates anunciou aos portugueses o «choque tecnológico» e disfarçou a "pobreza" profissional destas falsas carreiras com uns desejados «150 mil postos de trabalho».

  • Para Sócrates, 150 mil empregos em formação profissional a curto prazo e cientificidade relativa = à confiança política popular e empresarial.
  • Para o cidadão, 1 posto de trabalho = 1 salário = 6 meses, no mínimo, de autonomia económica.
  • Para o empresário, 1 posto de trabalho em formação profissional = compromisso de subsídios governamentais.


Uma "cabala" tecnológica porque o Primeiro Ministro sabe que no seu "tempo político" muitos lhe cobrarão uma determinada qualidade de vida. Sabe que a base da riqueza humana de uma nação privilegia a prática social das ciências (Educação) e o viver relacional com o conhecimento (Informação), mas que tudo isto é incompatível com o Síndroma da Pressa, um elemento espacial da era da globalização.
Esta matéria será sempre controversa porque o que está em causa não são ideais (ele próprio é pai de uma geração futura), mas défices e contribuições económicas que o barómetro europeu herdado de Mário Soares e os seus parceiros económicos não se irão coibir de cobrar no seu devido tempo.
O mundo da globalização significa a fluidez do conhecimento, a velocidade de realização social e a multiplicidade de acções humanas, ou seja, o tempo tão depressa é um aliado como um inimigo.
É como um grande campo de forças onde se degladiam indivíduos e condições de existência, meios humanos e sistemas sociais, inputs biológicos e outputs conjunturais (2).
É o móbile e o álibi dos "maus" governos, sejam eles conservadores ou liberais, de metodologias clássicas ou modernas e com economias obsoletas ou de ponta.
A um governo exige-se-lhe a organização do tempo económico e do nosso espaço de desenvolvimento para alcançá-lo, ou seja, espaço para a prática educativa e instituições do saber à altura
Os egípcios associavam à abstracção do tempo (Hach ou Heh) o número de um milhão. Não por ganância de acumulação, mas por essa imensidão numérica simbolizar a oportunidade de crescimento e a florescência.
Na práxis política e "globalizada" dos ministérios de educação não se exigem poderes divinos mas, independentemente da tecnologia e da sociedade formada e de informação, é preciso garantir que a ideologia vigente nunca se sobreponha ao ideal de entendimento sobre a condição temporal dos saberes e dos educandos.
O insucesso escolar também é resultado do Síndroma da Pressa moderno e este é filho do Princípio do Computacionismo (2) que fez do tempo a desculpa da globalização implacável e um inimigo para o valor intrínseco do conhecimento e do ensino.
Actualmente, alguns dos agentes de educação já podem contar o seu tempo de decadência profissional neste paradigma pós-moderno (a extinção de uma série de ramos do saber por se verificarem inviáveis no imediatismo das economias tecnológicas e "informatizadas") e a classe política futura sonhar o status das ideologias em prime-time que incorrem a gerar os novos "ignorantes" do mundo - os "escolarizados" inábeis do Síndroma da Pressa!
O insucesso escolar... talvez um paradigma dos tempos modernos!

§

(1) Teoria de onde surge a "Metáfora do computador" ou o conhecimento racional e complexo do novo homem "máquina".
(2) Conexionismo: ramo novo das ciências nos anos 80 em que o cérebro passa a equiparar-se a um maquinismo computacional na interpretação e reformulação do conhecimento.