segunda-feira, julho 25, 2005

Será caso para dizer, "O ‘Arrastão’ e o caso do Ministro das Finanças"


Revista do "Correio da Manhã"

A REALIDADE "À ROLHA"

O Comandante Oliveira Pereira da PSP de Lisboa confessava à jornalista Adriana Adringa «que o comunicado do presumível “arrastão” na Praia de Carcavelos por 500 indivíduos fora pressionado» pelo Comandante Gonçalves Pereira da PSP de Cascais, também ele sob pressão da Imprensa antecipada que o levou a figurar «500 adultos e jovens constituídos em gangs e que entraram às 15:00h na praia (...) e começaram a assaltar e agredir os banhistas».
No espaço de três dias «a PSP contactou vários especialistas» (quais?) «nomeadamente jornalistas» (desde quando?), mas jura «não ter sido a primeira a falar de "arrastão"».
O confessionário retórico e irrealista das presumíveis "pressões" (e aqui já se não se trata de prudência discursiva) alterna de classe e chega ao primeiro dos primeiros repórteres, que alega ter sido «pressionado pelo dono de um dos restaurantes da praia com provas fotográficas».
Quais? Uma verdadeira vaga de "pressões" é caso para se dizer!
Calculo que até a própria autarquia do concelho devia estar "pressionada" também.
É que só agora António Capucho se lembra de criticar o sensacionalismo mediático, oportunista e desonesto da efabulação das «centenas de marginais». Até à desmistificação pela imprensa (promovida indirectamente por Adringa, reconheça-se) e em pleno acontecimento, da sua 'boca autarca' só se ouviu que «era conhecedor da situação há anos» (qual situação?) e a «lamentável ausência do corpo de intervenção nas praias da Linha» (costumam lá andar?).
Onde nós chegámos: corpos em topless, corpos com tops e corpos de intervenção espraiando-se nas dunas popularuchas do Estoril burguês!
Nesta história de pressões a Imprensa foi quem teve sempre garantido o seu quinhão. Antes, com a manchete fraudulenta do “Arrastão em Carcavelos”, depois com a desmontagem da encenação do “O arrastão que nunca existiu” e, por enquanto, com a exposição do servilismo perverso que as estruturas de segurança do nosso país tem para com o jornalismo impiedoso.
Sobra-nos o país real:
- 2 queixas de roubo na PSP local;
- 4 indivíduos suspeitos e detidos (ainda sem processo sumário);
- O Estoril na boca do mundo graças à "corrupção ética" da imprensa portuguesa;
- uma portugalidade de ódios rácicos até agora adormecidos e herdados das antigas colónias ultramarinas que, aliados hoje à emigração maciça e ao aumento da marginalização social de grupos de risco (de desemprego e de ausência de formação escolar/profissional) prometem-nos, a curto prazo, uma população de tendência xenófoba.

CAMPOS E CUNHA

Afinal não havia caso para se fazer “caso” algum de Carcavelos. Na ressaca das “pressões” constatava-se que a realidade era reincidente: o quotidiano da delinquência mecânica que projecta uns biscates no verão distraído dos portugueses pelas praias mais populares, logo mais atractivas.
O mesmo não se poderá dizer da governação socialista. Tudo o que eclode pelas hostes extra-PS e que se esforça por teatralizar uma transparência prossecutória, acaba sempre por instaurar do nosso lado a desconfiança política.
Também uma declaração, uma causa pública, mas consequências reais e muito para lá do conforto 'empregado' que a Direcção Nacional da PSP tem ainda por privilégio.
A 17 de Julho, Luís Campos e Cunha, ministro das finanças, numa coluna prosaica do “Público” apresenta e avalia o relatório oficial do Banco de Portugal e do BCE.
«As previsões económicas para 2005-2006, para Portugal e Zona Euro, que se encontram abaixo das anteriores - por razões de todos conhecidas, e que, assim, impôe-se uma cautela ainda mais vigilante na disciplina orçamental, o que pode implicar mais medidas de contenção da despesa, possivelmente já para 2006».
Como financeiro governamental, o indigitado cumpre a sua obrigação, mas como discípulo de Sócrates esquece tanto a “pressão” do défice, como a “pressão” do “choque tecnológico” que o governo ainda tem para reanimar a crise social.
E, ao contrário dos comandantes, o representante não antevê o “arrastão” ministerial que o espera quando confessa - em rigor - o que isso pode significar para os projectos de Sócrates (em particular a política contributiva, o Aeroporto da Ota, ou até o TGV).
Logo a seguir à chegada às bancas do tablóide, José Sócrates anuncia em comunicado oficial o «requerimento ao Presidente da República da exoneração do ministro» e declara ter um substituto preparado para avançar.
A partir de agora uma acção comunicacional bem diferente. De Sócrates
a comunicação intencional 'limpa', de Campos e Cunha o relatório com suporte técnico e avaliação rigorosa e, incluído, a certificação da sua origem: «A qualidade da despesa pública está relacionada com tudo os aspectos da despesa, mas, em particular, com o investimento. A ideia, de que o investimento é sempre algo de bom é errada(…). Hoje viveríamos melhor se certos investimentos não tivessem sido realizados».
A honestidade política e a competência profissional que a PSP não teve, teve-a o ministro das finanças para com os seus eleitores e com o seu governo.
Luís Campos e Cunha equivocou-se. Sócrates tem os seus homens com as rédeas-curtas e, ao mais pequeno sinal de “pressão” social, não está com meias-medidas: despede-os como não despediu ninguém da PSP.
Não é só Mário Lino (pasta das Obras Públicas) que «quer assumir o risco, para fazer alguma coisa», foi-o também o financeiro, só que outro “risco”: o da transparência política e praticabilidade governativa.
Será caso para dizer que, ao contrário do “arrastão”, aqui é que há caso. O das nossas finanças e dos ministros socráticos! Como muito bem dizia Augusto Mateus, «a sair alguém não era o ministro das finanças» (o único até agora que não nos deu números à “pressão da rolha”), mas alguém nas chefias da Segurança Pública que nos deixou abalada a confiança nas suas competências.