sábado, junho 18, 2005

Queridos, mudei a casa!

A acusação de incompetência generalizada dos funcionários do Estado já se institucionalizou no discurso oficial, mas continua por se conhecer a ideia "revolucionária" e lógica inovadora de como o governo PS pretende tornar mais eficaz e produtiva a gestão governamental das suas instituições. Á medida que vêm chegando as novas leis a plebiscito, uma coisa torna-se suspeita, a hipótese da privatização dos comandos públicos e consequentes orgânicas superiores.
Que um governo descure a Inovação por entender que o que o país precisa é de ganhar força de produção e consistência qualitativa ainda se percebe e até se tolera, mesmo sabendo que mesmo num projecto de quatro anos isso é pouco salutar e, a curto prazo, significa regredir na eficácia da resposta.
Mas, que o mesmo entregue a exequibilidade pública ao jeito de "Querido Mudei a Casa", isso também é - no mínimo - inquietante.
Mude-se o que é preciso(!) da melhor maneira possível e com o timing que a máquina caduca e obsoleta exigir, e deixe-se para dias de maior fartura o que não é urgente ou até adiável, afinal estão em causa milhares de "oficializados" e "oficialismos" legitimados por leis constitucionais que o próprio PS há muito conhece e até foi cúmplice durante as suas anteriores governações.
Entre as coisas que não são claras está a acção lenta da reestruturação das chefias internas e o que parece ser um grande tapete vermelho com cláusulas de segurança e contrapartidas governamentais foi já lançado para as classes sociais não tradicionais e as dominantes nos tecidos económicos.
Ora, todos sabem que o gestor empresarial por definição não pode "servir o povo". Não porque lhe desagrade, mas porque se interiorizou eticamente em servir o seu próprio conforto e ascensão. A assunção de que as suas metas possam assumir os impulsos nacionais roça pouca inteligência, senão for ofensivo.
Quando António Costa sugeriu a infalibilidade das esferas superiores de direcção («increptização própria») na transparência total e com o recurso a modelos de gestão "politizados" - indivíduos por excelência envolvidos e actuantes na dinâmica social exterior - quatro coisas se sugerem:

  • a) o que resulta da legitimação desses cargos intermédios (os únicos de decisão superior que ainda estão livres da mão eleitoral) por parte da "massa funcional" e da cultura do empregado público?
  • b) como compatibilizar a "ambição honorária" típica destes gestores com projectos de "sacrifício" contínuos, frágeis e de responsabilidade social e extrapessoal?
    c) o que se institui "eticamente relevante" e de prioridade governativa para esses decisores quando personificam quadros de competência e formação desvinculados da "escola pública".
  • d) que garantias há de contrariar o compadrio, a cunha ou o favorecimento político, mesmo reinventando o «estatuto do pessoal dirigente», se a selecção continua a ser permeável porque sujeita a decisão hierárquica de outro cargo eleito anteriormente na esfera política vigente.

É óbvio que «o reforço da estabilidade das administrações e eficiência dos seus funcionamentos» pode valorizar-se pelo «intercâmbio de experiências de gestão privada e pública» - nada a apontar.
Qualquer empresa inteligente está em constante avaliação do resto do mercado competitivo. Mas não se deve assegurar a profissionalização formal "dos da casa" e que cá vão ficar até aos 65 anos (nova idade de reforma)?
Ou achará o PS que os cargos públicos de eleição política (que não são assim tão poucos) são suficientes para a exequibilidade das instituições - como se de um general severo e dominador ás suas tropas submissas se dirigisse.
José Sócrates elaborou, inclusive, uma «carta de missão» que avalia a temporalidade executiva mediante o cumprimento das metas estabelecidas.
Um corpo de normas «para a avaliação regular do desempenho e do serviço de que o dirigente é máximo» - nada a apontar.
Não somos avaliados todos os dias e consequentemente (des)promovidos por "subtis mudanças logísticas" no emprego?
Numa primeira leitura o que se questiona é o que as orientações desses cargos a "termo certo" (cuja agenda é passível de interrupção pelo não cumprimento dos compromissos) reflectem nas necessidades prossecutórias e intemporais das organizações públicas.
Uma coisa é certa, todas as carreiras de topo e poder de decisão vital na Administração Pública para além de não chegarem "a fazer escola" para o futuro (o que significa esvaziamento de qualidade profissional e identitária), incorrem perigosamente aos caprichos doutrinários da política vigente e sujeitam-se ás "modas pessoais" dos que por lá passam e sabem á partida que a responsabilização é relativa pela precariedade do vínculo administrativo.
"Queridos, mudei de casa!"