quinta-feira, março 10, 2005

Este sol à tarde? Uma farsa!!!!!!! (Frio Polar II)

A Comunicação Social no imediatismo com que nos entra pela casa adentro bem podia ter uma editoria mais: "Aconteceu ali ao lado, e se fosse aqui?"
Um staff redactorial apurado para as FCP (Funções Sociais Emergentes) com destreza para no meio de tanta informação descobrir a tempo o que se pode fazer antes de "O dali do lado" chegar cá.
O frio polar entrou pela janela dos fundos sem avisar nem dar tempo a que me pudesse defender, significando isso só uns míseros 10% contra a sua investida - já que vivo numa espécie de iglô de 1874, de 100m2 esquecidos de património para aquecê-lo com sucesso.
Excluindo os comerciantes astutos, de memória nada curta da última estação e já preparados para a procissão de clientes inevitável, chegou e surpreendeu tudo e todos de calças na mão.
Famílias houve que aumentaram os inestéticos aquecedores residentes, outras que aderiram ao luxuoso aquecimento interno e as frustradas do investimento que não há para as confortar já que as suas casas são verdadeiros chalés minhotos de Verão.
Encontro-me aqui nesta massa humana de quase 70% da população portuguesa cuja cabana de estilo rústico à Robin Crusoé não é passível de investidura alguma a não ser o derrube e a nova consolidação ambientada que, como imaginam, não passa pela cabeça de ninguém com bom senso.
O saldo está à vista: 1% contra o frio numas borrachinhas insignificantes e caríssimas para forrar as janelas e 99% de trapos e mais trapos que o gélido corpo possa aguentar em cima.
Meias de lã, roupa interior mais barata que a Termotebe, casacos sobrepondo-se a outros casacos, e para o chalé a criatividade XLLL que consiga desencantar na cabeçinha mirrada que nem uva jovem e queimada pelo frio transmontano.
TUDO CÁ PARA FORA!!!! A botija de água quente suspira de tanto trabalhar em regime non-stop, a
s janelas vão ficar fechadas até o Inverno se fartar destas paragens e os cobertores pirosos e pesadões da avó vergam na cama e entalam-me os ossos contra a carne até não me conseguir mexer.
Quando não durmo, só consigo estar no sofá de roupão, pijama por cima de pijama, manta e a prima da outra (botija) para a alma desconcentrada pelo estalar aflito das madeiras.
Nas pausas, qual café, qual passeio! Reprimo a condição vadia a gestos diminutos e a domesticidade do lar cinge-se ao asseio, ao chá quente e ao livrinho à sombra do candeeiro condutor de calor.
Este é o cenário simples porque o absurdo e novélico ainda estava por adivinhar.
Eu, que pensava que este Inverno polar ia fazer essencialmente vítimas no prét-a-porter da Capital, descobri que se não me ponho a pau acabo a estação envergando os trapos de uma sexualidade viúva e uma paixão contrariada.
Afinal, bem estava a Manuela de peito orgulhoso e resistente à desfaçatez dos 'monos' invernosos que o queriam reprimir e enclausurar. Eu bem procurava surpreender-lhe um reflexo pásmico dos membros expostos ou a pele de galinha implorando por alguma cobertura.
Nada... O sorriso não se lhe congelava e em passadas leves e com classe exemplar, lá caminhava a meu lado na rua sem que se notasse qualquer rigidez 'estalactante' na elegância a descoberto e ao desafio do vento antártico e déspota.
A Manuela continua um apreciável borracho para os machos e eu, a matrona bem aparelhada de lã e sugerindo mais 10Kg, batia os dentes e tudo o resto de matéria orgânica.
Um sucesso espantoso esta miúda... só não tenho coragem de a indagar como...
Para meu drama descobri que o meu companheiro afinal não elegeu para fetiche a impessoalidade dos hóteis, mas ameaçou discretamente a futura sazonalidade sexual lá de casa.
Depois de umas quantas noites bestiais em aquecimento ardente e sexo acondicionado ocasionou-se a falência económica e a inesperada recusa à lascívia caseira.
Os sinais eram mais que evidentes e completado o ciclo razoável das «dores de cabeça», do «cansaço», do «tenho que me levantar cedo e estou todo roto» e do «apetece-me fazer um cinema na cama» dá-se o momento em que galgo para cima dele entre os lençóis e com o 'membro' na mão encurralo-o firme e digo-lhe:
- Olha lá, mas o que é que se passa???
- Estou...
- Não estás nada caramba! O problema é esse. É que não estás com nada!
- ...

Rodeios, rodeios, e por fim o macho suspira a vergonha do atrofiamento a olhos vistos da sua virilidade e do recalcamento psíquico que lhe toldava o sentimento e a abordagem na hora de...
- Quê??????
O macho que até lá estava sempre a postos, perdera a pachorra e a militância genital perante o enrregelamento doméstico que lhe diminuía atrozmente o...
Para um homem que preza a acção com abordagens e ímpetos odisseicos, a nova configuração, ou melhor, a redução involuntária e descontrolada do... era verdadeira trágico-comédia de um Ulisses em inferioridade intransponível e revoltante.
O constrangimento fizera-se estigma e a índole máscula do herói (símbolo da capacidade masculina para superar as adversidades) sumiu-se-lhe mais toda a testosterona.
- Quê??????
- Desculpa... mas sexo só no hotel!
- Quê??????
- ...esperas até ao Verão?

Eu, que pensava que este Inverno Polar ia fazer essencialmente vítimas no prét-a-porter da Capital, descobri que se não me ponho a pau acabo sozinha com a sexualidade viúva e uma paixão contrariada.